MPF processa Iphan por obra ilegal em Magé
segunda-feira, 22 de abril de 2013Uma pequena estação de trem, à beira-mar e no extremo da antiga e tombada Estrada de Ferro Mauá, em Magé, promete virar uma dor de cabeça para a superintendente do Instituto Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), Maria Cristina Vereza Lodi, e seu antecessor no cargo, Carlos Fernando de Souza Leão de Andrade. O Ministério Público Federal (MPF) em guia São Gonçalo, na Região Metropolitana, entrou com ação civil pública por improbidade administrativa contra Maria Cristina e Carlos Fernando (que comandou o Iphan no estado entre outubro de 2006 e dezembro de 2011), que teriam permitido a ocupação irregular e a realização de obras sem supervisão técnica na Estação Guia de Pacobaíba, na Praia de Mauá. A estação é parte do conjunto arquitetônico da primeira ferrovia do país, ligando Mauá a Fragoso, em Magé. A ação questiona ainda um acordo feito pelo Iphan com uma empreiteira, para ocupação de um terreno adjacente à estação, que teria como contrapartida a manutenção do bem tombado, prerrogativa que não teria sido cumprida.
De acordo com ação, movida pelo procurador da República Lauro Coelho Junior, o Iphan firmou, em outubro de 2007, durante a gestão de Carlos Fernando, um termo de cessão de uso com a empresa GDK S/A, para utilização da área vizinha à estação. Em contrapartida, a empresa deveria promover o cercamento da área tombada e fornecer bens e serviços na cidade de Magé indicados pelo Iphan para conservação do bem tombado. Ainda segundo o MPF, a empresa ficaria ainda responsável pelo cadastramento de dezenas de famílias que moram em situação irregular em área contígua à estrada de ferro. O MPF reclama ainda que a cessão do terreno aconteceu sem licitação ou mesmo dispensa desse procedimento, violando a legislação. A GDK continua ocupando a área, uma vez que, de acordo com o MPF, o termo de cessão vem sendo prorrogado sucessivamente.
— A área ocupada pela GDK funciona como canteiro de obras para armazenagem de tubos de um projeto de tubulações submarinas de gás e petróleo. Como contrapartida, a empresa deveria repassar recursos da ordem de R$ 396 mil que seriam empregados na revitalização do bem tombado. Parte desse dinheiro foi repassada ao Iphan, mas nunca utilizado para essa finalidade — afirma o procurador.
Ainda segundo o procurador, na ausência de atuação do poder público na conservação do bem, a estação acabou invadida e reformada, em 2010, pela Associação Fluminense de Preservação Ferroviária (AFPF). Em vistoria feita pelo MPF em agosto de 2011, a estação encontrava-se conservada, mas ficou comprovado que a reforma havia sido realizada sem autorização formal do Iphan e sem observar critérios técnicos de restauração. O MPF acrescenta ainda que a ação da associação era de conhecimento do Iphan. Em depoimento, Carlos Fernando teria admitido conhecer as alterações feitas pela associação na estação e no entorno. Ele teria alegado que tais intervenções não necessitariam de autorização do Iphan. Já a atual superintendente do instituto também teria confirmado em depoimento que sabia da reforma feita no imóvel. Ainda assim, diz o MPF, não teriam tomado providências para sanar as irregularidades.
O inquérito que investiga a ocupação do imóvel e de seu entorno é de 2009. Segundo o procurador, desde então o MPF vinha tentando sensibilizar o Iphan para as irregularidades:
— Não se trata apenas de falta de recuperação do bem, mas irregularidades no uso do terreno e invasão do prédio da estação. É uma situação peculiar porque a associação invadiu para cuidar. É uma ação irregular, mas que acaba sendo um mal menor. Aquela área requer ações de longo prazo, como a recuperação da estação, uma política pública para a área, que está favelizada. Tentei articular uma solução. O que restou foi entrar com ação de sentido punitivo.
Caso sejam condenados, Carlos Fernando e Maria Cristina poderão ter os seus direitos políticos suspensos por até cinco anos, ser multados em até cem vezes o valor de suas remunerações, além de serem proibidos por até três anos de contratar com o poder público ou receber incentivos fiscais.
O ex-superintendente do Iphan disse ter ficado surpreso com a ação, uma vez que já teria prestado esclarecimentos ao MPF. Segundo ele, os arredores da estação de Guia de Pacobaíba foram invadidos por cerca de 80 famílias, mas que já há um projeto de reassentamento dos invasores em um terreno próximo, com recursos do Ministério das Cidades. Carlos Fernando alegou ainda que o tombamento da estação é discutível, uma vez que a estação original, de Barão de Mauá, que ficava em um cais na Praia de Mauá, não existe mais. Sobre a reforma da estação pela associação, Carlos Fernando defendeu o trabalho da entidade.
— Contratamos projeto de arquitetura para reassentamento das famílias. Havia recursos da União para o reassentamento. Depois disso não sei nais o que aconteceu. Já a associação cuida da memória ferroviária. Não é uma associação de bandidos. Aquilo tudo estava tomado de capim. A reforma não é o relevante. O relevante é que todo o ramal precisa ser recuperado e usado com trens turísticos.
A reportagem procurou a atual superintendente do Iphan, mas não obteve retorno. Em março passado, o MPF já havia denunciado a ex-prefeita de Magé, Núbia Cozzolino, e o ex-secretário municipal de Manutenção Pública, Paulo Afonso Abreu de Oliveira, por dano ao patrimônio cultural, uma vez que autorizaram o aterramento de parte dos trilhos da estrada de ferro Mauá, em Piabetá. Localizada em Magé, no Estado RJ, a Estrada de Ferro Mauá foi a primeira ferrovia do Brasil, inaugurada em 1854. O trecho que ligava Mauá à localidade de Fragoso foi declarado monumento histórico nacional, sendo tombado em 1954, em comemoração ao seu centenário. Após a liquidação da Rede Ferroviária Federal S.A. (RFFSA) em 1999, o trecho ferroviário e a antiga estação foram transferidos à União, cabendo ao Iphan o controle patrimonial e sua proteção.
Fonte: Notícias de Magé
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